Filhos biológicos, netos, bisnetos, “filha de leite” e filhos da “patroa”: a vida entre o cuidado como “obrigação”, “ajuda” e “profissão”
Publicado 2025-12-17 — Atualizado em 2025-12-17
Palavras-chave
- cuidados,
- lactancia cruzada,
- interseccionalidad,
- estratos populares
- care,
- cross-breastfeeding,
- intersectionality,
- lower classes
- Cuidado,
- amamentação cruzada,
- interseccionalidade,
- camadas populares
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Copyright (c) 2025 Olivia Nogueira Hirsch

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Resumo
Nesse artigo, parte de uma pesquisa mais ampla sobre o tema da amamentação cruzada, analiso a trajetória de uma mulher negra, hoje idosa, proveniente da favela da Rocinha, no Rio de Janeiro. A partir de sua narrativa procuro refletir sobre a pluralidade de formas e relações através das quais o trabalho de cuidado se exerce, analisando sua inserção em diferentes “circuitos de cuidado”: como “ajuda”, “obrigação” e “profissão” (Guimarães e Vieira, 2020). O cuidado por ela exercido ao longo da vida envolve desde filhos biológicos, crianças da vizinhança, uma “filha de leite”, passando por netos e bisnetos, até os filhos de suas empregadoras, uma vez que trabalhou durante muitos anos como doméstica. Se no âmbito do “cuidado como “ajuda” a relação é de simetria e voluntariedade, na experiência de “cuidado como profissão” a relação era atravessada por hierarquias e desigualdades. Ainda assim, as decisões e a forma como o cuidado devia ser exercido estavam em disputa, apontando para o fato de que os marcadores sociais da diferença, como classe, raça e gênero, não devem ser naturalizados. Isto porque, quando articulados, a depender do contexto, podem possibilitar a ação ainda que a partir de um ponto limitado do poder (Benítez, 2019, Piscitelli, 2008).
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