CLAVES. REVISTA DE HISTORIA
VOL. 11, N.° 21 JULIO DICIEMBRE 2025
ISSN 2393-6584 - MONTEVIDEO, URUGUAY
Pp. 1 -5
Ana María Rodríguez
Ayçaguer (2024)
Uruguay: entre las
grandes potencias y los
grandes vecinos. Escritos
sobre historia de la
política exterior
uruguaya (1900-1945)
Montevideo, Ediciones de la
Banda Oriental
Rafael Nascimento Gomes
1
Universidade de Brasilia
DOI: https://doi.org/10.25032/crh.v11i21.2648
A historiadora uruguaia Ana María Rodríguez Ayçaguer construiu, ao
longo de sua carreira, uma trajetória exemplar no campo da história política e
diplomática latino-americana, com especial dedicação às intricadas relações do
Uruguai com as grandes potências mundiais e seus vizinhos regionais. Sua mais
recente obra, Uruguay entre las grandes potencias y los grandes vecinos.
Escritos sobre historia de la política exterior uruguaya (1900-1945), publicada
1
Rafael Do Nascimento. Doutor em História pelo Programa de Pós-Graduação em História
da Universidade de Brasília (2021). Possui mestrado (2014-2016) e graduação em História na
mesma instituição (2010-2013). Realizou intercâmbio na Universidad de la República (UdelaR),
em Montevidéu (2012). Pesquisa sobre a História da América Latina, História do Uruguai,
História das Relações Internacionais do Brasil e História do Rio da Prata. É membro do Núcleo
de Estudos Latino-Americanos (IREL/UnB). Em 2017, publicou o livro "As relações diplomáticas
entre Brasil e Uruguai (1931-1398): O Brasil de Getúlio Vargas visto pelo Uruguai de Gabriel
Terra" pela Paco Editorial (SP). Em 2023, publicou o livro "As relações diplomáticas entre Brasil
e Uruguai durante o Estado Novo (1937-1945): Aproximação, vigilância e consolidação" pela
mesma editora.
ANA MARÍA RODRÍGUEZ: URUGUAY ENTRE LAS GRANDES POTENCIAS
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em 2024 pela Ediciones de la Banda Oriental, coroa uma vida acadêmica marcada
pelo rigor metodológico, pela profundidade analítica e pelo compromisso com a
história como ferramenta de compreensão crítica do presente.
A obra, organizada a partir de artigos anteriormente publicados em
revistas acadêmicas de prestígio, reúne estudos fundamentais sobre o
comportamento internacional do Uruguai em um período de intensas
transformações políticas, marcado pela Primeira Guerra Mundial, o entre-
guerras e o início da Segunda Guerra Mundial. Desde as primeiras páginas, a
autora reafirma sua filiação metodológica à história política renovada, atenta não
apenas às estruturas diplomáticas formais, mas às redes informais, aos discursos
políticos e às estratégias cotidianas de negociação. A partir de documentação
diversificada correspondência diplomática, atas parlamentares, jornais da
época e fontes secundárias críticas —, Rodríguez Ayçaguer propõe uma leitura
que recusa tanto a historiografia laudatória, que celebra a neutralidade uruguaia
como expressão de pacifismo e vocação democrática, quanto as interpretações
economicistas simplistas. Em seu lugar, oferece um quadro interpretativo que
compreende a política externa uruguaia como expressão de interesses
pragmáticos, negociações complexas e tensões ideológicas internas e externas.
Uma das teses centrais do livro reside na concepção de que o Uruguai,
durante o período analisado, praticou uma diplomacia de equilíbrio, orientada
por sua condição de pequeno Estado geograficamente situado entre dois vizinhos
hegemônicos Brasil e Argentina e pressionado pelas potências extra-
regionais, como Estados Unidos e Reino Unido. Nesse sentido, a política externa
uruguaia aparece como produto de uma tensão permanente entre a defesa de sua
soberania e a necessidade de adaptação às circunstâncias internacionais,
revelando um exercício constante de mediação e sobrevivência diplomática. Isto
é, a obra articula, de forma orgânica, os microprocessos políticos internos as
disputas partidárias, as alianças momentâneas e as tensões sociais com as
dinâmicas geopolíticas globais, algo que Ayçaguer realiza sem perder o foco na
soberania nacional e na especificidade uruguaia. Trata-se de um livro que, ao
mesmo tempo, contribui para a historiografia latino-americana e dialoga com a
história diplomática global.
RAFAEL NASCIMENTO GOMES
FACULTAD DE HUMANIDADES Y CIENCIAS DE LA EDUCACIÓN, UNIVERSIDAD DE LA REPÚBLICA
Rodríguez Ayçaguer demonstra que, apesar da aparente constância de
certas diretrizes oficiais como a neutralidade e o pan-americanismo —, o
Uruguai articulou distintas estratégias de inserção internacional conforme os
contextos regionais e globais. Em fóruns multilaterais e conferências
internacionais, o país projetava-se como defensor do direito internacional e da
solução pacífica de controvérsias. Contudo, nos bastidores diplomáticos e nas
relações bilaterais, operava com um pragmatismo que muitas vezes contrariava
os discursos oficiais, evidenciando o jogo diplomático realista exigido pela sua
posição geopolítica.
Outro mérito da obra é seu exame da dimensão humana da política
externa. A autora evidencia como as trajetórias pessoais, as orientações
ideológicas e as conexões políticas das elites diplomáticas e parlamentares
uruguaias influenciaram diretamente as decisões de política externa. Ao
privilegiar a análise prosopográfica desses atores, Rodríguez Ayçaguer ilumina a
importância das ideias e das práticas individuais na formulação da estratégia
internacional uruguaia, mostrando como a política externa foi também um
espaço de disputas internas e de afirmação de projetos políticos nacionais.
A relação do Uruguai com os vizinhos Brasil e Argentina ocupa lugar
central no livro, tratada de maneira crítica e original. A autora analisa como as
rivalidades entre os dois gigantes regionais foram instrumentalizadas pelo
Uruguai para obter concessões e ampliar sua margem de manobra diplomática.
Nesse ponto, Rodríguez Ayçaguer rejeita a ideia de que o país atuava apenas como
Estado-tampão ou espectador passivo, atribuindo-lhe capacidade de agência e
inteligência estratégica na condução de sua política exterior. A obra desvenda,
assim, episódios pouco explorados pela historiografia tradicional, como os
acordos comerciais seletivos e as alianças episódicas com um ou outro vizinho, a
depender do contexto político e econômico.
A historiadora reserva ainda atenção especial ao papel das ideias e das
doutrinas jurídicas internacionais na construção da política externa uruguaia.
Analisando a adesão formal do Uruguai a princípios como a autodeterminação
dos povos, a igualdade soberana dos Estados e a não intervenção, a autora revela
a ambivalência entre o discurso jurídico progressista e a prática diplomática
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pragmática, evidenciando contradições típicas de países periféricos no sistema
internacional da primeira metade do século XX. Essa abordagem dialoga com
tendências contemporâneas da história das relações internacionais, que
valorizam a história intelectual e cultural da diplomacia.
Outro ponto forte do livro é o diálogo estabelecido com a historiografia
regional e internacional. Rodríguez Ayçaguer debate-se criticamente com autores
como Carlos Escudé e Tulio Halperin Donghi, propondo deslocamentos
interpretativos e sugerindo novas agendas de pesquisa. A autora defende a
centralidade dos pequenos Estados na dinâmica regional sul-americana,
contrariando leituras que marginalizam esses agentes na análise das relações
internacionais. Ao fazê-lo, contribui para a renovação da história diplomática
latino-americana, aproximando-se de abordagens transnacionais e de história
conectada.
O livro encerra-se com reflexões sobre o impacto da Segunda Guerra
Mundial no posicionamento externo uruguaio, momento em que a tensão entre
neutralidade e alinhamento se tornou particularmente aguda. Rodríguez
Ayçaguer analisa como o governo uruguaio buscou preservar sua autonomia
diplomática diante das pressões estadunidenses e britânicas, sem romper com os
princípios tradicionais de sua política externa. Esse estudo finaliza a coletânea de
forma exemplar, reiterando a pertinência das teses defendidas ao longo da obra
e apontando para a importância de se repensar o papel dos pequenos Estados em
contextos de conflagração global.
Além disso, a linguagem clara e o cuidado narrativo tornam a leitura
acessível não apenas a especialistas, mas também a estudantes e interessados em
compreender os dilemas da política externa uruguaia e, por extensão, os desafios
das pequenas nações em cenários internacionais marcados pela assimetria de
poder.
Em suma, Uruguay entre las grandes potencias y los grandes vecinos é
mais do que uma reunião de ensaios: é o testemunho de uma historiadora que
soube fazer de seu ofício uma ferramenta de resistência intelectual e valorização
da memória política de seu país. É uma obra historiográficamente robusta,
RAFAEL NASCIMENTO GOMES
FACULTAD DE HUMANIDADES Y CIENCIAS DE LA EDUCACIÓN, UNIVERSIDAD DE LA REPÚBLICA
metodologicamente refinada e intelectualmente instigante. Ana María Rodríguez
Ayçaguer reafirma-se como referência fundamental na história diplomática
latino-americana, oferecendo um estudo exemplar sobre a política externa
uruguaia e suas dinâmicas internas e externas. Trata-se de leitura obrigatória
para estudiosos da história das relações internacionais, da política externa do
Cone Sul e para todos aqueles interessados em compreender as estratégias dos
pequenos Estados em sistemas internacionais assimétricos. ◊